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SEÇÃO I: Bioética – Capítulo II: Bioética Principialista e o Código de Ética Médica




     

    SEÇÃO I: Bioética - Capítulo II: Bioética Principialista e o Código de Ética Médica

    Português Brasileiro

    SEÇÃO I: Bioética
    Capítulo II: Bioética Principialista e o Código de Ética Médica

    Ana Cristina Ribeiro Zöllner
    Clóvis Francisco Constantino

    Tratado de Pediatria – Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) – 5ª edição (2022)


    Tratado de Pediatria - Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) - 5ª edição (2022)

    A SBP vem ampliando suas ações em várias vertentes, sobretudo na área de atualização científica de qualidade para os pediatras brasileiros. Uma dessas iniciativas é representada pela quinta edição do Tratado de Pediatria, que foi completamente revisada e atualizada nos últimos meses com cuidado para ser entregue àqueles que se incumbem de assistir às crianças e aos adolescentes.

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    ♦ Código de Ética Médica em Vigor

    O Código de Ética Médica (CEM) atual estabelece diretrizes que delimitam responsabilidades, direitos e deveres tanto para médicos quanto para pacientes. Esses princípios fundamentais e normas deontológicas são essenciais para garantir a ética no exercício da profissão. O código em vigor foi publicado através da Resolução CFM no 2.217/2018 no Diário Oficial da União (DOU).

    Atualizações e Modernizações

    O código anterior, datado de 2010, representava um avanço significativo no que tange à ética, moralidade e práticas médicas. No entanto, com o rápido progresso tecnológico e científico, surgiu a necessidade de revisões e atualizações que acompanhassem as novas demandas da sociedade e da legislação vigente.

    A formulação do código atual contou com uma extensa consulta pública organizada pelo Conselho Federal de Medicina (CFM). Especialistas de diferentes áreas, como Bioética, Filosofia, Ética Médica, Teologia e Direito, contribuíram ativamente para a atualização e modernização das normas.

    O novo CEM trouxe avanços importantes, incluindo a proteção ao médico com necessidades especiais ou doenças crônicas. Esses profissionais podem continuar a exercer sua função, respeitando os limites de suas capacidades, desde que isso não coloque em risco a saúde e a vida dos pacientes.

    • Mídias Sociais e Telemedicina: o código também abrange temas como telemedicina e o uso de mídias sociais na prática médica. Com a evolução constante da tecnologia, o CFM reconhece que novas resoluções podem ser necessárias para regulamentar essas áreas de forma atualizada e eficiente.

    • Ensino, Pesquisa e Gestão os aspectos relacionados ao ensino, pesquisa e gestão médica também foram revistos com cuidado, visando o aprimoramento contínuo da prática profissional e das relações entre médicos e pacientes.

    • Autonomia e Dignidade: o respeito à autonomia do paciente, assim como o reconhecimento da dignidade humana em situações de terminalidade da vida, continuam sendo pilares fundamentais do Código de Ética Médica.

    • Sigilo Profissional: o sigilo profissional, um dos princípios mais antigos da medicina, que remonta a Hipócrates, foi revisado e enfatizado no código atual, destacando sua importância para a prática ética e a confiança na relação médico-paciente.

    Prontuário do Paciente: entre os diversos documentos médicos que têm valor legal, o prontuário do paciente se destaca pela sua relevância no contexto do código. Ele deve ser elaborado com extremo cuidado, de forma completa e detalhada, envolvendo múltiplos profissionais e disciplinas. Um prontuário bem estruturado é comparável a um “plano de voo”, cuja negligência pode levar a graves consequências, assim como a falha em um voo real pode resultar em desastre.

    ♦ Os Princípios Fundamentais

    O professor norte-americano da área de Oncologia, Van Rensselaer Potter, destacou no início dos anos 1970, em suas publicações, os desafios éticos que surgiam com os rápidos avanços científicos. Ele propôs um novo campo de conhecimento que permitiria às pessoas refletirem sobre as implicações éticas, tanto positivas quanto negativas, desses avanços. Potter sugeriu a criação de uma “ponte” entre a ciência e as humanidades, defendendo que “nem tudo o que é cientificamente possível é eticamente aceitável”.

    Relatório Belmont e Princípios de Bioética

    Em 1978, o Relatório Belmont foi publicado para orientar pesquisas envolvendo seres humanos, baseando-se no princípio do respeito à pessoa humana. A partir disso, surgiram ferramentas, chamadas de “princípios”, para facilitar o estudo e a tomada de decisões sobre temas de bioética. Esses princípios tornaram-se os referenciais da bioética principialista.

    Já em 1979, Tom Beauchamps e James Childress, do Kennedy Institute of Ethics, expandiram o uso desses princípios da pesquisa para a prática médica, aplicando-os em todos os contextos relacionados à saúde. A utilização desses princípios é amplamente difundida tanto nos Estados Unidos quanto no Brasil.

    1. Princípio da Beneficência e Não Maleficência

    Os princípios de beneficência e não maleficência sempre foram essenciais para as profissões da saúde, que buscam o benefício e, acima de tudo, a ausência de danos aos pacientes e à sociedade.

    Na ética médica, o princípio de não maleficência está relacionado à expressão “primum non nocere”, que significa “primeiro, não causar dano”. Essa ideia remonta ao primeiro livro de Hipócrates, Epidemia, de 430 a.C., onde se afirma que o médico deve “ajudar ou não prejudicar o paciente”.

    O famoso Juramento de Hipócrates incorpora tanto o princípio da não maleficência quanto o da beneficência ao afirmar: “Usarei meu poder para ajudar os doentes com o melhor de minha habilidade e julgamento; abster-me-ei de causar danos ou enganar a qualquer pessoa”.

    A beneficência refere-se à obrigação de “fazer o bem”, enquanto a não maleficência significa “evitar o mal”. Juntos, esses princípios guiam a prática ética da medicina.

    2. Princípio da Autonomia

    No Brasil, o Código de Ética Médica estabelece que o princípio da autonomia deve ser exercido, exigindo que nenhum procedimento médico seja realizado sem o prévio consentimento esclarecido do paciente ou de seu responsável, exceto em situações de emergência que coloquem a vida em risco.

    A autonomia diz respeito ao direito de autodeterminação de uma pessoa sobre as decisões que envolvem sua vida, saúde e integridade. Isso pressupõe a existência de opções válidas e liberdade de escolha, desde que o indivíduo tenha capacidade de compreender e consentir de forma adequada. O princípio da autonomia está profundamente ligado ao respeito pela dignidade humana, conforme o imperativo categórico kantiano, que afirma que cada ser humano é um fim em si mesmo.

    O princípio da autonomia é expresso através do consentimento esclarecido. Todos os indivíduos têm o direito de consentir ou recusar procedimentos preventivos, diagnósticos, terapêuticos ou de reabilitação que possam afetar sua integridade física, mental ou social. Esse consentimento deve ser dado de forma livre e esclarecida, com todas as informações necessárias sendo fornecidas em um nível de entendimento compatível com o paciente.

    O consentimento não é apenas uma formalidade; é o exercício pleno do direito de o paciente decidir o que é melhor para si, após receber todas as informações relevantes. Além disso, o consentimento pode ser revogado a qualquer momento. É importante lembrar que qualquer forma de pressão ou coerção compromete a autonomia.

    Limitações à Autonomia

    Embora a autonomia seja um direito fundamental, ela não deve ser confundida com liberdade absoluta ou individualismo extremo. Seus limites são estabelecidos pelo respeito aos direitos de outros indivíduos e ao bem coletivo. Na medicina, esses limites também incluem os princípios éticos e o conhecimento científico estabelecido.

    Na prática médica, a autonomia dos menores de idade é representada pelos pais ou responsáveis, que tomam as decisões por eles. Contudo, as decisões devem sempre buscar o melhor interesse da criança.

    Autonomia e Direitos Humanos

    A Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 1948, reafirma que todos os indivíduos são livres por natureza. Esse princípio é essencial para a compreensão e aplicação do conceito de autonomia na prática médica.

    3. Princípio da Justiça

    Beauchamp e Childress definem o princípio da justiça como uma forma de justiça distributiva, ou seja, a distribuição justa, equitativa e apropriada de benefícios e encargos dentro da sociedade. Essa justiça deve ser aplicada com base em normas que regem a cooperação social. Segundo essa visão, a justiça é alcançada quando uma pessoa recebe aquilo que lhe é devido de acordo com suas circunstâncias ou propriedades específicas.

    Aristóteles, em sua concepção de justiça formal, afirmou que “iguais devem ser tratados de forma igual, e os diferentes de forma diferente”. Esse princípio sugere que a justiça não é apenas uma questão de igualdade simples, mas de tratamento adequado baseado nas diferenças entre os indivíduos.

    O Relatório Belmont fez importantes considerações sobre o princípio da justiça, afirmando que uma injustiça ocorre quando um benefício que uma pessoa merece é negado sem justificativa, ou quando um encargo é indevidamente imposto. O relatório também ressaltou a necessidade de definir quem deve ser tratado de forma igual e quais fatores justificam a distribuição desigual de benefícios ou encargos.

    Formas de Distribuição

    Existem diferentes maneiras de distribuir benefícios e encargos, todas baseadas em propriedades individuais relevantes, tais como:

    • A cada pessoa uma parte igual;
    • A cada pessoa de acordo com sua necessidade;
    • A cada pessoa conforme seu esforço individual;
    • A cada pessoa com base em sua contribuição à sociedade;
    • A cada pessoa de acordo com seu mérito.

    Dessa forma, o conceito de equidade propõe que cada pessoa receba o que lhe é devido de acordo com suas necessidades, reconhecendo que, assim como as pessoas são diferentes, suas necessidades também variam.

    Bioética e Justiça

    A bioética busca construir uma “ponte” entre o conhecimento científico e o conhecimento humanístico, com o objetivo de minimizar os impactos negativos que os avanços tecnológicos podem ter sobre a vida humana. O foco é garantir que a justiça seja aplicada ao considerar tanto os benefícios quanto os riscos que a ciência e a tecnologia trazem para a sociedade.

    ♦ O Código de Ética Médica e a Bioética

    O Código de Ética Médica no Brasil caminha junto com os princípios da bioética, evoluindo progressivamente desde sua versão de 1988. Tanto o código quanto a bioética visam o aprimoramento contínuo da prática médica, sempre respeitando os princípios de justiça, equidade e ética na assistência à saúde.

    Clique para acessar o Código de Ética Médica, Resolução CFM Nº 2.217, de 27 de SETEMBRO de 2018.

    A Medicina é a arte de cuidar fundamentada nas evidências científicas disponíveis, e é nelas que se baseia todo o processo de decisão clínica. Contudo, é igualmente importante o equilíbrio com a ética deontológica, que define os deveres do médico, e com a Bioética, que incorpora virtudes, reflexões e princípios essenciais ao exercício da profissão. Esse equilíbrio é sustentado por um respeito inabalável à dignidade humana, que deve sempre ser o norte de qualquer intervenção médica.

    Os dispositivos do Código de Ética Médica se relacionam profundamente com conceitos de moralidade, ética e humanidades. Através da reflexão ética e bioética, é possível garantir que a pluralidade das discussões esteja presente e que as decisões médicas sejam tomadas com responsabilidade e evolução constante, acompanhando as mudanças da sociedade e da ciência.


    Referências Bibliográficas

    • SOCIEDADE BRASILEIRA DE PEDIATRIA. Tratado de Pediatria. 5. ed. Barueri: Manole, 2022.

    • Dr. Marcelo Meirelles
    – Médico Pediatra
    – Médico Hebiatra (Especialista em Medicina do Adolescente)
    – Psiquiatria na Infância e Adolescência




     

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