6. Avaliação na Estabilização/Reanimação
As decisões quanto à estabilização/reanimação dependem da avaliação simultânea da FC e da respiração. A SatO2 precisa ser monitorada no RN ≥ 34 semanas que recebe VPP.
6.1. Frequência Cardíaca
A FC é o principal determinante da decisão de indicar as diversas manobras de reanimação. Avaliar a FC de maneira rápida, acu-rada e confiável é um ponto crítico para a tomada de decisões em sala de parto. Os principais métodos de avaliação da FC nos primeiros minutos de vida incluem:
▪ palpação do cordão umbilical;
▪ ausculta do precórdio com estetoscópio;
▪ detecção do sinal de pulso pela oximetria;
▪ verificação da atividade elétrica do coração pelo monitor cardíaco.
Estudos sugerem que o monitor cardíaco permite a detecção acurada, rápida e contínua da FC logo após o nascimento. Tanto a palpação do cordão quanto a ausculta precordial subestimam a FC em cerca de 15-25 bpm, em comparação ao monitor cardíaco. A oximetria detecta de forma contínua a frequência de pulso, mas demora mais do que o monitor cardíaco para detectar a FC e subestima seus valores nos primeiros minutos de vida.
Vale lembrar que vários fatores interferem na obtenção rápida de um sinal confiável de pulso ao nascimento como a presença de vérnix caseoso, a circulação transicional e a movimentação, entre outros. Todos os métodos que subestimam o valor da FC nos primeiros minutos de vida podem levar a um aumento desnecessário de intervenções na sala de parto.
Se o monitor cardíaco não estiver disponível, a ausculta acompanhada da oximetria de pulso é uma alternativa possível, mas as limitações destas técnicas para avaliar a FC ao nascer devem ser consideradas.
Diversos modos de monitoração, além dos acima descritos, têm sido estudados, como o estetoscópio digital, o Doppler visível ou audível, o uso de eletrodos secos, entre outros, mas não existem evidências para a indicação do seu uso na prática clínica.
Independentemente do modo de avaliação da FC, considera-se adequada a FC ≥ 100 bpm nos primeiros minutos após o nasci-mento. A bradicardia é definida como FC < 100 bpm. A melhora da FC é o indicador mais sensível da eficácia dos procedimentos de reanimação neonatal.
6.2. Respiração
A avaliação da respiração é feita por meio da observação da expansão torácica do RN ou da presença de choro:
▪ a respiração espontânea está adequada se os movimentos são regulares e suficientes para manter a FC > 100 bpm;
▪ se o paciente não apresentar movimentos respiratórios, se eles forem irregulares ou o padrão for do tipo gasping (suspiros profundos entremeados por apneias), a respiração está inadequada.
* A avaliação da respiração por meio da observação clínica não possibilita conhecer a efetividade dos movimentos respiratórios quanto à mecânica pulmonar, em especial no que se refere ao estabelecimento da capacidade residual funcional e à oferta de volume corrente adequado para a troca gasosa.
Vários monitores de função respiratória estão disponíveis para uso neonatal, mas são aparelhos diversos quanto ao funcionamento e aos parâmetros avaliados. Ou seja, os estudos da aplicação desses monitores na reanimação neonatal são heterogêneos. Três ensaios clínicos randomizados avaliaram o papel do monitor de função respiratória para ajudar o profissional de saúde a avaliar a efetividade da respiração do RN e/ou da ventilação a ele oferecida. Tais estudos mostram que a visualização dos dados do monitor respiratório faz com que a VPP com máscara facial seja aplicada com menor escape de gás e com maior volume corrente, mas não demonstram claramente o benefício do uso desse monitor durante a estabilização/reanimação do RN quanto a desfechos importantes em médio e longo prazo. O uso dos monitores respiratórios depende de treinamento para entender e analisar as variáveis de mecânica pulmonar. Vale ressaltar que não há avaliação do potencial desses monitores para distrair o profissional de saúde do foco principal, ou seja, o paciente. Além disso, não há análise do custo da implementação desse monitor de modo uni-versal, nas salas de parto. Dessa forma, apesar do monitor de função respiratória fornecer dados objetivos quanto à mecânica pulmonar durante a VPP na sala de parto, a avaliação de seus benefícios e riscos precisa de novos estudos.
6.3. Saturação de Oxigênio
A oximetria de pulso, para acompanhar a SatO2, auxilia na tomada de decisões quanto ao manejo ventilatório em sala de parto.
A avaliação da SatO2 é feita pela medida do diferencial da absorção de luz em dois comprimentos de onda pela oxiemoglobina e pela hemoglobina reduzida:
▪ medida de monitoração contínua, não invasiva, fácil de usar e com boa correlação com a SatO2 real em RN sem hipoxemia ou com hipoxemia leve;
▪ é preciso algum cuidado na sua interpretação diante de situações de hipoxemia grave e movimentação excessiva dos membros;
▪ aplicar sempre o sensor neonatal no membro superior direito, na região do pulso radial, para monitorar a SatO2 pré-ductal; após posicionar o sensor, conectá-lo ao cabo do oxímetro;
▪ a leitura confiável da SatO2 demora cerca de 1-2 minutos após o nascimento, desde que haja débito cardíaco suficiente, com perfusão periférica.
A SatO2 alvo recomendada baseia-se em estudos realizados em RN a termo com boa vitalidade e que não receberam qualquer manobra de reanimação, no quais foi mensurada a SatO2 pré-ductal no decorrer dos 10 primeiros minutos, sendo construídas curvas de normalidade com valores medianos e intervalos interquartis. Com base nesses estudos, o PRN-SBP recomenda, desde 2011, os valores abaixo de SatO2 alvo, de acordo com os minutos de vida.
Tabela 4. SatO2 alvo, de acordo com os minutos de vida | |
---|---|
Sinal | 0 |
Até 5 | 70-80% |
5-10 | 80-90% |
> 10 | 85-95% |
Vale lembrar que, nos RN que não precisam de procedimentos de reanimação, a SatO2 com 1 minuto de vida se situa ao redor de 60-65%, só atingindo valores entre 87-92% no 5º minuto. Assim, o processo de transição normal para alcançar uma SatO2 > 90% requer 5 minutos ou mais em RN saudáveis que respiram ar ambiente. A monitorização da SatO2 possibilita o uso criterioso e racional do O2 suplementar, quando necessário.
Quando o RN não melhora e/ou não atinge os valores desejáveis de SatO2 com a VPP em ar ambiente, recomenda-se sempre verificar e corrigir a técnica da ventilação antes de oferecer oxigênio suplementar. A necessidade de oxigênio suplementar é excepcional em RN ≥ 34 semanas se a VPP é feita com a técnica adequada. Nos poucos casos em que isto é necessário, indica-se a aplicação da mistura O2/ar, ajustando-se a concentração de oxigênio por meio de um blender para atingir a SatO2 desejável. Assim, sugere-se, nos raros pacientes em que há necessidade de oxigênio suplementar durante a ventilação, aumentar a concentração de O2 gradualmente, se necessário.
Em RN ≥ 34 semanas, o uso de concentrações elevadas de oxigênio associa-se ao atraso para iniciar a respiração espontânea após o nascimento e à maior mortalidade neonatal, em comparação à VPP iniciada com ar ambiente. Como a SatO2 > 95% está associada a valores elevados e não previsíveis de pressão parcial arterial de O2, o oxigênio suplementar deve ser cuidadosamente titulado, de modo que a SatO2 não ultrapasse valores acima de 95% na sala de parto. Quando o oxigênio suplementar é administrado ao RN, sua concentração deve ser reduzida o mais rápido possível, de acordo com a oximetria de pulso.
6.4. Avaliação na Prática
Nos RN em que foram realizados os passos iniciais da estabilização e a avaliação mostrou respiração espontânea regular e FC > 100 bpm, avaliar as condições clínicas gerais e, sempre que possível, ainda na sala de parto, deixá-lo em contato pele a pele com a mãe, coberto com tecido de algodão seco e aquecido. De maneira continuada, observar a atividade, o tônus muscular e a respiração/choro.
Já naqueles RN em que foram realizados os passos iniciais da estabilização e a avaliação a seguir mostrou respiração ausente ou irregular ou FC < 100 bpm, iniciar a VPP nos primeiros 60 segundos após o nascimento e acompanhar a FC pelo monitor cardíaco e a saturação de oxigênio (SatO2) pelo oxímetro de pulso.
▪ Fazer a avaliação inicial da FC, logo após os passos iniciais, por meio da ausculta do precórdio com o estetoscópio. Auscultar por seis segundos e multiplicar o valor por 10, resultando no número de batimentos por minuto (bpm). Nesse momento, considera-se adequada a FC > 100 bpm.
▪ Se a FC for < 100 bpm ou o RN não apresentar movimentos respiratórios regulares, enquanto um profissional de saúde inicia a VPP, o outro fixa o sensor do oxímetro e os três eletrodos do monitor cardíaco.
▪ Quanto ao oxímetro, aplicar sempre o sensor neonatal no membro superior direito, na região do pulso radial, para monitorar a SatO2 pré-ductal. Para obter o sinal com maior rapidez, siga esta sequência:
– ligar o oxímetro;
– aplicar o sensor neonatal no pulso radial direito, cuidando para que o sensor que emite luz fique na posição diretamente oposta ao que recebe a luz e envolvendo-os com uma bandagem elástica;
– conectar o sensor e o cabo ao oxímetro.
Várias técnicas podem ser utilizadas para obter o sinal elétrico do coração.
▪ Um modo prático de conseguir rapidamente esse sinal é colocar um eletrodo em cada braço próximo ao ombro e o terceiro eletrodo na face anterior da coxa.
▪ Para fixação, envolver a região do braço/perna que está com o eletrodo em bandagem elástica.
Outra técnica alternativa é deixar os três eletrodos previamente preparados, conectados ao monitor, prontos para aplicação no tórax por meio de quadrado plástico de 7×7 cm. Nesse quadrado, são feitos três orifícios para acoplar os eletrodos, de tal maneira que dois eletrodos fiquem paralelos e sejam posicionados na porção anterossuperior do tórax logo acima dos mamilos e o terceiro eletrodo seja posicionado mais abaixo, no hipocôndrio esquerdo.
Essa última técnica foi testada em 71 RN entre 25 e 42 semanas de gestação, incluindo 23 que foram reanimados. O tempo para aplicar o filme plástico com os três eletrodos acoplados no tórax foi de 6-10 segundos e para detectar a FC de 15 a 37 segundos.
Vale ressaltar que, na avaliação feita pelo monitor cardíaco nos minutos iniciais depois do nascimento, o objetivo primário é o acompanhamento da FC e não a detecção de ritmos anômalos no traçado eletrocardiográfico.
6.4.1. Escore de Apgar
O Escore de Apgar é determinado no 1° e 5° minutos após a extração completa do produto conceptual do corpo da mãe, mas não é utilizado para indicar procedimentos na reanimação neonatal. Sua aplicação permite avaliar a resposta do paciente às manobras realizadas e a sua eficácia.
Se o Apgar é < 7 no 5° minuto, recomenda-se realizá-lo a cada cinco minutos, até 20 minutos de vida. É necessário documentar o Escore de Apgar de maneira concomitante à dos procedimentos de reanimação executados, conforma tabela abaixo.
Tabela 5. Escore de Apgar | |||
---|---|---|---|
SINAL | 0 | 1 | 2 |
Cor | Cianose e/ou palidez | Corpo róseo com extremidades cianóticas | Corpo e extremidade róseos |
Frequência cardíaca | Ausente | < 100 bpm | > 100 bpm |
Irritabilidade reflexa | Sem resposta | Careta | Choro ou movimento de retirada |
Tônus muscular | Flacidez total | Alguma flexão | Movimentos ativos |
Respiração | Ausente | Irregular | Regular e/ou choro forte |
Nos RN em que foram realizados os passos iniciais da estabilização e a avaliação mostrou respiração espontânea regular e FC > 100 bpm, avaliar as condições clínicas gerais e, sempre que possível, ainda na sala de parto, deixá-lo em contato pele a pele com a mãe, coberto com tecido de algodão seco e aquecido. De maneira continuada, observar a atividade, o tônus muscular e a respiração/choro.
Já naqueles RN em que foram realizados os passos iniciais da estabilização e a avaliação a seguir mostrou respiração au-sente ou irregular ou FC < 100 bpm, iniciar a VPP nos primeiros 60 segundos após o nascimento e acompanhar a FC pelo monitor cardíaco e a saturação de oxigênio (SatO2) pelo oxímetro de pulso.